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Gravidade

A argúcia de Einstein transfigurou a mais antiga e importante intuição humana a respeito do mundo material

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h46 - Publicado em 31 mar 1988, 22h00

Clifford M. Will

Em 1936, 29 anos depois de ter elaborado as suas novas idéias sobre o Universo, Einstein fez uma previsão espetacular, capaz não apenas de convencer os mais céticos como também de encher os olhos do mundo por sua beleza. Segundo o cientista, sob certas circunstâncias, a imagem de uma galáxia poderia ficar inteiramente distorcida, perdendo a forma de um grande disco de estrelas, como geralmente se vê nos telescópios, para se transformar em um anel de luz. Era uma metamorfose radical, cuja observação o próprio Einstein considerou improvável, com os instrumentos da época. Tinha razão: foram necessários nada menos de 52 anos ate que, finalmente em meados de 1988, um grupo de astrônomos chefiados pela americana Jacqueline Hewitt descreveu um espantoso objeto celeste na constelação do Leão, ao qual deu-se o nome de MG-1131+0456. Semelhante a uma galáxia sob diversos aspectos, tinha no entanto, a forma de um colar, algo muito suspeito segundo as leis tradicionais da Astronomia (SI nº. 9, ano 2).

A princípio, os autores da descoberta não acreditaram no que estavam vendo. “Pensamos que fosse um erro do computador”, confessou Jacqueline. O problema é que o objeto estava sendo observado por suas emissões de rádio e não de luz. Na teoria, não há diferença, mas na prática o radiotelescópio tem de estar acoplado a um computador capaz de converter os sinais de rádio em imagens visuais. Convencida de que não havia erro, depois de cuidadosa checagem, a astrônoma enunciou que estava realmente observando uma galáxia com a forma de um anel de Einstein, comprovando a previsão do mestre – com todas as suas conseqüências. Pois não se tratava apenas da imagem. Estava em jogo, especialmente, o modo como o cientista entendia o conceito de massa – provavelmente a mais antiga e mais importante intuição do homem a respeito do mundo físico.

Desde o advento da ciência, de fato, a massa foi confundida com o peso dos corpos, inspirando, assim, uma das primeiras leis da Mecânica – a bem conhecida lei da alavanca, do grego Arquimedes (C.290-280 a.C.-211 a. C.)

Clifford M. Will é professor de Física da Universidade Washington, em Saint Louis, Missouri, Estados Unidos, autor do livro Was Winstein Right? (“Einstein tinha razão?”), ainda não editado no Brasil.

O segredo da galáxia transfigurado

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Mas Einstein foi muito além, imaginando corpos sem massa, como é o caso da luz, na sua Teoria da Relatividade. Apesar disso, a luz poderia ainda ter peso, isto é, comportar-se como os corpos normais. Era exatamente o que acontecia no episódio da galáxia transfigurada: os raios de luz e de rádio que ela emitia estavam sendo atraídos e desviados pela massa de outra galáxia, conforme verificou Jacqueline Hewitt. Como o desvio ocorria de maneira altamente simétrica, em torno desse centro de atração, a imagem da primeira galáxia tornava-se aproximadamente circular, como um colar ou um anel.

Einstein não contava com o auxílio dos atuais telescópios, mas pôde prever a existência do fenômeno por meio de uma análise cuidado do mundo físico e suas leis. O seu segredo era uma perspicácia muito aguçada, que lhe permitia ver coisas maravilhosas onde qualquer outra pessoa veria apenas fatos vulgares. Nesse sentido, a descoberta da influência da massa sobre o espaço e o tempo é exemplar. O conceito pode ser apreendido a partir de uma experiência com um imaginário elevador-foguete (veja ilustração). Embora pareça muito simples, esse teste revela que a massa da Terra deve agir sobre um raio de luz viajando no espaço rumo à sua superfície.

A ação provoca uma mudança na cor ou, em linguagem mais técnica na freqüência de vibração da luz, cuja tendência é crescer quando se passa do vermelho para o amarelo e daí para o verde e o azul. Um homem dentro do elevador mediria uma freqüência mais baixa em seus próprios instrumentos, em comparação com a que registraria, dali mesmo, na superfície do planeta. Para descobrir como isso acontece, o primeiro passo é recorrer a um artifício aparentemente absurdo, mas na verdade muito inteligente: imaginar que a Terra não tem massa. Essa idéia funciona para o homem no elevador porque ele está caindo e por isso não tem peso como acontece com os astronautas em órbita (SI n.º 5, ano 3). Para ele, portanto, é como se massa da Terra não existisse.

O resultado do teste: uma interferência invisível

A conclusão é essencial porque, nesse caso, o homem também pode ignorar o seu próprio movimento. Declara, simplesmente, que não está sendo atraído para baixo, mas, em vez disso, é o solo que está subindo em sua direção com velocidade crescente. Nesse ponto, então, entra em cena o raio de luz que, a despeito de qualquer artifício, prossegue inflexível em seu trajeto descendente e apressa o seu próprio encontro com o solo em ascensão. O resultado é uma soma de velocidades que provoca uma vem conhecida alteração na cor da luz, fazendo-a a passar dos tons mais avermelhados para os tons azuis.

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De imediato, não é importante saber como essa mudança se processa (ilustração). Mas o efeito final é decisivo para o teste do elevador. A questão é a seguinte: como poderia uma pessoa parada na superfície da Terra explicar essa mudança de cor?Ela não vê o solo subindo em direção ao raio de luz, notando apenas o movimento descendente deste último com a velocidade padrão da luz. Portanto, não há nenhuma soma de velocidade e tampouco há mudança de cor. A conclusão surpreendente, mas inequívoca, nesse caso, é que a alteração de tonalidade se deve à presença da Terra, cuja massa está agindo sobre o raio de luz.

Feitas todas as contas, a interferência é literalmente desprezível, como se pode notar comparando a variação de freqüência com o valor padrão medido no elevador: se o raio for emitido da altura de 100 metros, a mudança será 1 trilhão de vezes menor do que 1 por cento do valor padrão. Não há olho capaz de apreciar uma nuance cromática tão ínfima. No entanto, o resultado é claro e, quando se lida com corpos do porte de uma galáxia em distâncias astronômicas, a cão das massas toma proporções majestosas, como no caso do anel cósmico. Existe ainda uma diferença com relação ao teste do elevador, onde há uma mudança na freqüência da luz, mas não há alteração de trejatória, como na galáxia vista por Jacqueline Hewitt.

Isso se explica porque, dependendo da maneira como se observa a influência das massas, pode-se obter um efeito do tipo espacial, como um desvio na rota de um raio de luz. Ou então pode aparecer um efeito nas coordenadas do próprio tempo – imaginado por Einstein como u personagem semelhante ao espaço. Este último resultado reflete-se no ritmo de vibração do pulso luminoso, pois a freqüência é definida como o número de vibrações por segundo, Então, se em certa região do espaço-tempo o segundo demora mais para passa, haverá maior número de vibrações luminosas e, portanto, uma freqüência mais alta.

O melhor teste já realizado para avaliar a influência da massa sobre o ritmo do tempo data de 1976. A experiência seguiu à risca o exemplo do elevador, só que empregando um foguete da NASA, o Scout-D, que transportava o mais preciso modelo de relógio existente. Funcionando com feixes de luz semelhantes ao laser, esse equipamento contava o tempo a partir de medidas diretas das freqüências luminosas. As medidas se realizavam enquanto o foguete subia até um altura de 10 mil quilômetros. Como o Scout-D já estava com os motores desligados, o relógio a bordo flutuava sem peso, fora da influência da massa terrestre. Enquanto isso, o tempo era medido na Terra com um relógio idêntico ao primeiro, mas sob influência do peso. Em conseqüência, seu ritmo se alterou em comparação ao cronômetro do foguete.

Um atraso de segundos na história do Universo

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O valor exato do descompasso foi de quatro partes em 10 bilhões, indicando a variação da freqüência nos feixes de laser empregados nos cronômetros, ‘ igual a 1420 megahertz ou quase 1,5 bilhão de vibrações por segundo. Um erro de quatro partes em 10 bilhões significa algo como o atraso de alguns segundos em toda a história do Universo. Isso dá uma idéia também dos desvios no tempo, que passou ligeiramente mais rápido no foguete. Em comparação com o ritmo apresentado na Terra. Vale notar que esses resultados foram tão difíceis de obter quanto as imagens distorcidas da Astronomia. Antes do experimento de 1976, de fato, o primeiro vestibular realmente sério das idéias einsteinianas sobre o tempo havia sido realizados em 1960, com pelo menos 44 anos de atraso em relação à teoria.

Os ritmos da luz

A luz muda de cor pela mesma razão que o som se torna mais agudo ou mais grave. O apito de um trem, por exemplo, é mais agudo quando o trem esta se aproximando do que quando está parado na estação. A ilustração representa duas ondas de som ou de luz: uma onda mais concentrada (em cima) e outra menos (embaixo). A luz é uma onda, vibração elétrica que se propaga pelo espaço, e a cor corresponde ao número de vibrações recebidas pelo olho a cada momento. Assim, quando a fonte de luz se aproxima, as ondas se concentram, chegando em maior número ao olho. Na ilustração elas encolhem. Assim, a cor passa do vermelho, uma vibração menos intensa, para o azul, mais intensa.

A gravidade em cores

Um homem vai ao espaço num hipotético elevador (primeiro quadro) para investigar como se comporta um raio de luz nas vizinhanças da Terra. O raio é emitido quando o homem chega ao topo (segundo quadro) e começa a cair. Como os astronautas em órbita, o homem não tem peso, ou seja, não sente a atração da gravidade (terceiro quadro). Por isso, pode imaginar que está imóvel e que seu movimento se de á ascensão da superfície do planeta. O raciocínio é perfeitamente lógico do ponto de vista da Teoria da Relatividade. Mas essa inversão de movimentos afetaria a luz: sua velocidade descendente se somaria à velocidade ascendente do solo e assim o raio luminoso mudaria de cor (quarto quadro). Isso mostra que a luz sofre a ação da gravidade criada pela massa da Terra, que é a causa inicial da queda do homem.

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O anel de Einstein

Em 1988, meio século depois de Einstein ter previsto que a imagem de uma galáxia pode ficar distorcida por causa da força gravitacional, astrônomos americanos descobriram um objeto celeste catalogado como MG 1131+0456, coma forma de um anel de luz. Era efetivamente uma galáxia – e a distorção registrada pelos radiotelescópios confirmava plenamente as inovadoras idéias de Einstein sobre a influência da massa sobre a luz.

Um erro de 1 centésimo de 1 por cento

A prova consistiu em medir o encurtamento da vida de partículas subatômicas (que se desintegram rapidamente), enquanto eram atiradas por um acelerador para o alto de uma torre na Universidade Harvard, nos estados Unidos. Na avaliação final, os dados teóricos foram comprovados com um erro pequeno: cerca de 1 por cento,. Uma década mais tarde, fez grande sucesso uma volta ao mundo realizada por jatos comerciais transportando relógios atômicos a grande altitude. O erro, desta vez, caiu para menos de 0,5 por cento. Finalmente, em 1976, os valores obtidos puderam ser considerados acima de qualquer suspeita. O erro ficou abaixo de 1 centésimo de 1 por cento.

Esses resultados, extremamente precisos, revelam toda a força da imaginação de Einstein. Trazem novamente à memória o simples e ousado artifício inicial – o de que a massa da Terra podia ser ignorada por um viajante em queda livre no espaço.

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O raciocínio explicado por um pequeno mistério
Vê-se agora que esse modo de pensar, longe de ser absurdo, foi capaz de revelar algo novo sobre a natureza dos corpos. Nesse ponto, no entanto, é preciso entender um pouco melhor o raciocínio de Einstein, que ele mesmo explicou sob a forma de um pequeno mistério. Por exemplo: de que maneira um grupo de astronautas perdidos no espaço veria uma grande massa distante, que inicialmente são incapazes de identificar? Nessa cena (ilustração), o primeiro fato importante é que os astronautas não têm nenhum marco de referência, a não ser as estrelas distantes.

Por isso, não têm como saber se estão em movimento ou em repouso. A massa misteriosa, por sua vez, aparece na escuridão do espaço, onde não há um Sol para iluminá-la. Em outras palavras, os astronautas podem apenas notar que, depois de surgir à sua vista, a massa está se aproximando com velocidade crescente. Portanto, uma hipótese extremamente desagradável começa a se formar na mente dos homens. Eles pensam que estão sendo atraídos pela gravidade criada pela massa – provavelmente de um planeta desconhecido, onde acabarão caindo.

Essa hipótese, de fato, é muito provável, já que a gravidade atrai os corpos com velocidade crescente, como os astronautas podem verificar pela rapidez com que a imagem do suposto planeta se amplia em sua direção. Outra característica-chave da gravidade é que ela imprime a mesma velocidade – ou o mesmo aumento de velocidade – em todos os corpos. Isso também pode ser verificado pelos astronautas: gordos ou magros, eles caem todos juntos, nenhum mais depressa do que os outros. Mas então surge uma idéia nova, digna da que ocorreu ao gênio Einstein.

Um dos astronautas sugere que simplesmente não há planeta nenhum: provavelmente o que estão vendo é apenas uma estrutura oca, feito uma imensa antena parabólica, viajando em sua direção. Seja o que for, essa estrutura está sendo impulsionada por foguetes cuja força lhe imprime uma velocidade crescente. Em resumo, toda a cena é uma perfeita réplica da ação que uma massa criaria no espaço vazio à sua volta. Ninguém está caindo e nenhum dos astronautas, de fato, saiu do seu lugar, desde o aparecimento da enigmática forma na escuridão. Afinal, com alívio, os homens verificam que o seu comportamento está certo. Einstein também sentiu grande alegria quando percebeu que esse tipo de ilusão era possível. É que ela lhe permite ampliar a idéia da relatividade para os movimentos acelerados, sem ficar restrito aos corpos dotados de velocidade constante, sem aceleração. A evolução dessa idéia começou há mais de 2 mil anos e ainda domina toda a física moderna.

Em velocidade constante, o corpo está em repouso

A raiz do problema consiste em saber com segurança quando um corpo está ou não está em movimento. Para os antigos, era simples: um corpo está em repouso quando está imóvel em relação à Terra, que, por sua vez, está m repouso absoluto no Universo. Mais tarde se descobriu que a Terra está em movimento, atrapalhando o esquema a Física antiga. Em compensação, descobriu-se que qualquer corpo dotado de velocidade constante podia ser considerado em repouso. Por exemplo, um carro a 50 quilômetros por hora é ultrapassado por outro a 60 quilômetros por hora. Nessa situação, ao fim de uma hora, a distância entre eles será de 10 quilômetros. Mas, então, pode-se imaginar que o primeiro carro está parado e apenas o segundo avança à velocidade relativa de 10 quilômetros. Ou, ainda, que o segundo está parado e o primeiro fica para trás com a mesma velocidade relativa. O que conta não é a velocidade em relação ao solo – de 50 e 60 quilômetros horários, respectivamente -, mas a velocidade relativa entre os veículos.

Nesse caso, ponderou Einstein, o mesmo se aplica ao movimento acelerado dos astronautas. O exemplo mostra que há duas situações de repouso equivalentes: ou existe um planeta em repouso e os astronautas estão movendo em sua direção ou então os astronautas é que estão em repouso e existe outro corpo se movendo no seu rumo. A conclusão é que, mesmo quando um corpo possui velocidade variável, pode ser considerado em repouso. É claro que nesse caso há alguns detalhes fundamentais. O mais surpreendente, sem dúvida alguma, ocorre quando os astronautas querem considerar-se em movimento.

Nesse caso, precisam atribuir ao corpo em repouso uma massa capaz de atrair por igual qualquer objeto à sua volta. Cão contrário, não haveria equivalência com a situação oposta, em que uma estrutura oca se aproxima do grupo de homens – certamente aparentando a mesma velocidade para cada um deles. Mas o fato é que as massas têm exatamente essa propriedade – estranha, à primeira vista – de conferir o mesmo movimento a todos os corpos, pequenos ou grandes, leves ou pesados. Na época de Einstein, esse fenômeno já era conhecido há mais de duzentos anos, sem que houvesse uma explicação para ele. Agora, tornou-se uma simples conseqüência da relatividade dos movimentos acelerados: para que a relatividade exista, as massas devem ter essa propriedade.
O novo modo de ver o mundo foi uma revelação

“Esse foi o pensamento mais feliz da minha vida”, escreveu Einstein, quando começou a esboçar o seu novo princípio da Relatividade, em 1907. Dois anos antes, ele já havia feito uma correção importante na relatividade tradicional, mostrando que ela acabava com o repouso absoluto, mas apenas em parte. A Terra certamente, já não era um lugar eternamente imóvel no Universo, mas o tempo continuava a correr com o mesmo ritmo em qualquer ponto do espaço. O físico corrigiu isso adotando tempos relativos, de modo que, se um corpo está em repouso, o relógio que o acompanha tem um ritmo padrão. Mas esse ritmo torna-se mais lento nos relógios que acompanham outros corpos dotados de velocidade constante com relação ao primeiro.

Nesse caso, foi importante a descoberta de que a velocidade da luz nunca se altera e assim podia ser usada como um meio de comparar o ritmo do tempo nos diversos relógios em movimento. A velocidade da luz também mostrou que as distâncias encolhiam ou se alongavam dependendo da velocidade do corpo onde eram medidas. Afinal, em 1907, Einstein começou a trabalhar com as massas e com os movimentos acelerados, concluindo então que o espaço e o tempo tinham que sofrer alterações ainda mais radicais. Nas vizinhanças de um planeta em repouso e dotado de massa, o espaço-tempo se tornava curvo – de tal modo que um corpo nessa região experimentaria um movimento de queda em velocidade crescente.

Essa mesma situação pode ser percebida do ponto de vista invertido: nela, um astronauta em repouso num espaço-tempo plano vê um planeta destituído de massa subir em sua direção com velocidade crescente. As duas situações são perfeitamente equivalentes – e este é o sentido profundo da imensa reforma feita por Einstein no edifício conceitual da Física. E não foi uma simples mudança formal, pois, como se viu, essa nova maneira de encarar o mundo revelou fenômenos jamais suspeitados a partir da perspectiva tradicional.

Fuga para o vermelho

Exemplo de uma situação real de deslocamento da luz para o vermelho. Na ilustração, a luz foi emitida por uma mesma substância existente em galáxias que estão diferentes distâncias da Terra e se afastam com velocidades também diferentes. Quando mais distante uma galáxia, mais depressa ela se afasta da Terra e, portanto, a sua luz tende mais fortemente para o vermelho. Se o raio de luz fosse emitido sob a ação de forças gravitacionais crescentes, a sua cor se deslocaria na mesma direção – dos tons azuis para os avermelhados. Nesse caso, a luz está escapando da força gravitacional, por isso tende ao avermelhado. Se estivesse avançando em direção à força (por exemplo, atraída por um planeta), tenderia ao azul

Ilusão no espaço

Três astronautas perdidos tentam identificar um corpo difuso que vislumbram de muito longe na escuridão interestelar (primeiro quadro). Aos poucos percebem que estão se aproximando do corpo, cujas dimensões crescem cada vez mais de perto (segundo quadro). Mas tudo não se passa de ilusão: trata-se, na verdade, de uma imensa antena parabólica, cuja velocidade cresce devido ao impulso de foguetes (terceiro quadro). Esse tipo de ilusão mostra que os movimentos acelerados são relativos: os astronautas pensavam que estavam caindo, embora estivessem imóveis o tempo todo.

Adaptado por Flávio Dieguez

Para saber mais: O que é Física, Ernst W. Hambúrguer, Brasiliense, São Paulo, 1984

O amigo oculto de Einstein

L.W.

Em 1904, quando trabalhava no Escritório Federal Suíço de Patentes, em Berna, e ruminava a revolucionária idéia da Relatividade, Albert Einstein tinha o costume de dar longos e sossegados passeios com um colega de repartição, um engenheiro e matemático de afiada inteligência chamado Michele Angelo Besso. Suíço de nascimento, de uma família de judeus italianos, Besso não entrou para a história da ciência. Mas foi com ele – e ao que tudo indica que só com ele – que o maior cientista do século discutiu sua Teoria da Especial Relatividade, antes de publicá-la em 1905. Einstein, no final do trabalho, escreveu um agradecimento a Besso pelas “várias e valiosas sugestões” que dele recebeu – pena que, transmitidas de boca, não se saiba jamais quais foram.

Einstein conheceu Besso, seis anos mais velho, por volta de 1897, quando ambos estudavam na Politécnica de Zurique e freqüentavam os saraus musicais da família Hünis, em cuja casa Einstein exercitava-se no violino. A amizade entre eles era intensa – e só terminaria com a morte dos dois, com poucas semanas de intervalos, em 1955. Foi também uma amizade peculiar, à distância, pois a partir de 1911 eles praticamente não mais se viram, morando em cidades, países e, enfim, continentes diferentes. O vínculo se manteve, porém, por escrito: Einstein e Besso, de fato, escreveram um ao outro pelo menos 110 cartas. A torrencial correspondência, recolhida nos anos 60, lança uma luz preciosa sobre a face menos conhecida da vida do temperamento de Einstein.

A amizade dos dois transbordava, de longe, ciência e trabalho. Foi Albert quem apresentou a Michele Ângelo aquela que viria a ser sua mulher pela vida toda, Anna Barbara Winteler. Einstein, ele próprio, tinha se casado em 1903 com Mileva Maric, de quem se divorciaria em 1919. Mas, no início, a vida conjugal parecia idílica ao cientista. Certa vez, Besso recebeu do amigo em Trieste, Itália, uma carta reveladora. “Minha mulher e eu levamos uma vida extremamente agradável”, deleitava-se Einstein. “Ela se ocupa perfeitamente em tudo, cozinha muito bem e está sempre alegre.” O tom íntimo da correspondência era uma raridade no caso de Einstein, pouco dado a amizades próximas e ao que chamava com derrisão “o meramente pessoal”.

Nas cartas a Besso, em meio a parágrafos dedicados à ciência, Einstein abria o coração. Como em 1917, ao tratar dos problemas psicológicos de seu filho Eduard, nascido em 1910 e que viria a falecer em 1965 num hospital psiquiátrico. “Não é de se esperar que algum dia ele se torne um homem como os outros”, escreve Einstein. “Quem sabe, talvez fosse melhor se ele tivesse deixado este mundo antes de ter conhecido a vida. Pela primeira vez, me sinto responsável e me recrimino.” Em 1926, quatro anos depois de ganhar o Prêmio Nobel, o cientista soube que o diretor do Escritório de Patentes, onde Besso continuava a trabalhar, queria demiti-lo. Escreveu-lhe então: “O forte Besso reside na sua incomum inteligência. (…) Sua fraqueza é seu insuficiente espírito de decisão. Disso resultou uma situação trágica: um empregado que eu qualificaria de insubstituível dá a impressão de ser ineficiente”. É claro que depois disso ninguém ousou substituir Michele Angelo Besso.

Sua morte, em março de 1955, ensejou uma das cartas mais pessoas de Einstein. Dirigida ao filho e à irmã do amigo, confidencia: “O que eu mais admirava em Michele era o fato de ter sido capaz de viver tantos anos com a mulher, não só em paz como também em constante união, algo em relação a que eu fracasse duas vezes. “…) Ao deixar este estranho mundo, ele mais uma vez se antecipou a mim. Isso não quer dizer nada. Para aqueles de nós que acreditam na Física, esta separação entre passado, presente e futuro é só uma ilusão, embora tenaz”.

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